Recentemente reportagens divulgadas pela imprensa de Jundiaí contando a comovente história sobre uma menina de 12 anos, que havia fugido de uma casa de prostituição em Fortaleza, chamou a atenção de muita gente.
Nesta terça-feira a DDM – Delegacia da Defesa da Mulher divulgou a verdadeira história e tudo não passou de uma farsa criada pela suposta adolescente. Na verdade a ‘menina de 12 anos’ é uma mulher e bem mais velha, ou seja, 34 anos.
De acordo com as investigações a mulher tem contando a mesma história mentirosa já há alguns anos em cidades de vários estados do país, para conseguir ser sustentada por pessoas sensibilizadas com seu ‘drama’.
Com a descoberta realizada por um minucioso trabalho dos investigadores a ‘vítima’ passou a criminosa. Ela foi indiciada por falsidade ideológica, uma vez que fez inserir em documentos públicos declarações falsas, com o fim de criar obrigação das instituições públicas. O inquérito policial, assim que finalizado, será remetido ao Ministério Público e ao Poder Judiciário para as providências pertinentes.
Por não se tratar de flagrante, ela foi liberada para responder pelo crime em liberdade. De acordo com a delegada da DDM, a mulher não havia desembarcado em Jundiaí, no dia dos fatos, vinda de Fortaleza, mas, sim, de São Paulo, onde também tentava aplicar golpes.
O que divulgou a DDM de Jundiaí
Aportou na Delegacia de Defesa da Mulher de Jundiaí boletim de ocorrência realizado no Plantão Policial com relatos de que Guardas Municipais foram abordados por uma ”adolescente”, que se apresentou como “Ana Clara”, de doze anos de idade, sem portar documento de identidade, informando que havia fugido de uma casa de prostituição na cidade de Fortaleza/CE, onde era mantida em cárcere privado por pessoas que diziam serem seus pais e obrigada a manter relação sexual com diversos clientes desde sua infância e que, para que suportasse tais práticas, era constantemente submetida a injeções de hormônio, mencionando inclusive envolvimento de políticos e autoridades. Consta relato ainda de que as vítimas das mesmas práticas, quando cresciam, eram descartadas em forma de rituais de magia negra, e muitas vezes bebês eram sacrificados nesses rituais. A “adolescente” informou ainda que um caminhoneiro a ajudou fugir de Fortaleza e a deixou neste município de Jundiaí, onde encontrou com um desconhecido e com ele fez “programa” em troca de local para dormir.
Diante do exposto, remeteu-se cópia do boletim de ocorrência para a Delegacia de Fortaleza para apuração dos fatos ocorridos naquele município, enquanto na DDM de Jundiaí foram realizadas diligências a fim de apurar suposto crime de estupro de vulnerável.
Seguindo, a equipe de investigação da Delegacia de Defesa da Mulher passou a realizar as investigações, deslocando-se ao Hospital Universitário, onde teve o primeiro contato com “Ana Clara”, verificando que ela possuía um comportamento infantilizado, aparência depressiva e não queria conversar. A equipe verificou ainda que a “adolescente’ tinha um porte físico grande para uma pessoa de doze anos de idade e isso chamou a atenção, bem como chamou atenção o sotaque que não parecia de alguém natural de Fortaleza e que tinha saído de lá pela primeira vez. Ademais, a equipe constatou que a ‘adolescente” tinha várias cicatrizes, porém ela não deixou que fossem realizados quaisquer exames, dizendo ter pânico de agulhas devido aos rituais satânicos.
Prosseguindo com a investigação, de posse da qualificação de “Ana Clara”, foram realizadas pesquisas nos sistemas policiais, inclusive em banco nacional de dados, porém a equipe não localizou qualquer pessoa com o nome com o qual ela se apresentou, cujos pais fossem os mesmos igualmente por ela informados, o que levantou a hipótese de que tais dados fossem falsos.
Enquanto as investigações prosseguiam, a “adolescente” foi acolhida, inicialmente pela Casa Transitória de Jundiaí, onde ficou por pouco tempo até que pediu para sair, dizendo que as crianças de lá a faziam lembrar-se das crianças de Fortaleza, e por essa razão tinha pensamentos suicidas. A “adolescente” então foi transferida para o CAPS Infanto-juvenil, onde passou a ter acompanhamento de perto e receber cuidados específicos, pois se comportava de uma maneira muito introspectiva e se negava a fazer exames médicos.
Em 19 de agosto de 2022 a equipe compareceu no CAPS e coletou as impressões digitais de “Ana Clara” para proceder à sua identificação através do IIRGD, porém restou infrutífera, não constando sua identidade no banco de dado do Estado de São Paulo.
Ademais, a “adolescente” passou por perícia médica no IML, onde constatou conjunção carnal não recente e cicatrizes pelo corpo.
Em determinado momento “Ana Clara” informou que em decorrência dos rituais satânicos possuía muitas agulhas pelo corpo, motivo pelo qual a equipe de investigação e o CAPS a levaram ao Hospital Universitário para realização de Raio X, o que resultou na confirmação de seu relato, uma vez que foram identificadas inúmeras agulhas por seu corpo.
Em seguida, de posse do Raio X, uma médica elaborou laudo constatando que a idade óssea da “adolescente” era compatível com 18 anos ou mais, segundo o método Greulich-Pyle.
Deste modo, e devido a algumas incongruências apresentadas por “Ana Clara”, ao tipo de fala que ela apresentava e o raciocínio incompatível com uma pessoa de 12 anos de idade, que teria vivido uma vida inteira em cárcere privado, a Delegacia passou a desconfiar de seus relatos e, em busca na internet, localizou-se uma matéria jornalística de doze anos atrás, onde havia narrativa semelhante, de uma adolescente de 13 anos de idade que sofria as mesmas violências, que havia fugido de Fortaleza/CE para Natal/RN, onde registrou ocorrência.
De mais a mais, a equipe contatou o Hospital Maria Alice Fernandes, na cidade de Natal/RN, onde a adolescente da matéria passou por atendimento e cirurgias para retirada de agulhas do corpo, o qual forneceu à DDM, após encaminhamento de ofício, o prontuário médico dessa suposta vítima, com fotos da paciente, quando se verificou que se tratava da mesma pessoa que nesta cidade se apresentou como Ana Clara, a adolescente de 12 anos de idade.
Assim, confirmou-se que “Ana Clara”, na verdade, é A. S. O., nascida em 05/05/1988, ou seja, uma mulher de 34 anos de idade.
Seguindo, a equipe conversou com A.S.O. e expôs que já tinha conhecimento de sua verdadeira identidade, ao passo que ela confessou que tinha o costume de fazer isso, porque, há doze anos, quando o fez pela primeira vez, as pessoas se comoveram e a ajudaram com comida, abrigo, roupas, alimentação, remédios, dinheiro, e que tudo começou quando foi abusada sexualmente por seu pai, na infância, e sua genitora não acreditou. Contou que as agulhas foram inseridas em seu corpo por ela própria, e que faz isso porque a dor física ameniza suas angústias. Relatou ainda que já passou pelo Estado do Rio de Janeiro, do Espírito Santo, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, entre outros, sempre trocando de nome.
Acrescente-se, ainda, que a Delegacia de Defesa da Mulher de Jundiaí manteve contato com algumas autoridades policiais de Natal/RN e Fortaleza/CE, que muito contribuíram para as investigações e inclusive confirmaram a identidade de A.S.O.
Por fim, A. S. O. foi indiciada pelo crime de falsidade ideológica, uma vez que fez inserir em documentos públicos declarações falsas, com o fim de criar obrigação das instituições públicas, e o inquérito policial, assim que finalizado, será remetido ao Ministério Público e ao Poder Judiciário para as providências pertinentes.
Fonte: DDM Jundiaí/Dr Marcel Feher – delegado de polícia