Pouco depois de outro aumento no preço da gasolina anunciado pela Petrobras e sete semanas consecutivas de alta nos postos do país, motoristas de aplicativo afirmam que nem mesmo os reajustes nos preços do transporte de aplicativo anunciados pelas principais empresas do setor (Uber e 99) têm sido suficientes para garantir o custo-benefício de levar clientes em troca de uma renda extra.
A gasolina no Brasil vem registrando valor médio superior a R$ 6 o litro, o preço mais caro da história, em aumento de quase R$ 80 desde o início do ano. Outros combustíveis utilizados pelos motoristas, como etanol, diesel, GLP (gás liquefeito de petróleo) e GNV (gás natural veicular), também sofrem com as altas.
Na capital paulista, onde os reajustes no preço do combustível foram altos em diversos bairros, milhares de motoristas desistiram da profissão. “A gente bate na tecla de 25%, mas eu posso afirmar que o percentual [de pessoas que saíram da profissão] aumentou para 28%”, relata o presidente da Amasp (Associação de Motoristas de Aplicativo de São Paulo), Eduardo Lima de Souza.
Para controlar a evasão de motoristas e as reclamações de clientes, as plataformas anunciaram reajustes no valor das corridas.
A Uber, por exemplo, estabeleceu aumento direto no preço, que chega a 35% de reajuste na Grande São Paulo. Já a 99 anunciou que a taxa subirá 25% em alguns municípios, mas que o aumento será totalmente subsidiado pela empresa.
A novidade não conseguiu acalmar o motorista Rosemar Pereira, que mora em Aricanduva, zona leste de São Paulo, e trabalha 12 horas por dia. Ele afirma que para conseguir valores melhores ainda precisa se deslocar para outras regiões de São Paulo, o que acaba não compensando, em razão da despesa com combustível. Em locais e momentos com alta demanda, o preço dinâmico adotado pelas principais empresas de app faz o valor das corridas subir.
“Se eu estiver em um lado da cidade, vou ter que atravessar São Paulo para conseguir a viagem com um valor melhor. Todo o lucro que eu ia ter eu já gastei em combustível atrás desse aumento aí”, relata Pereira.
Os motoristas explicam que a baixa lucratividade é responsável direta pela quantidade de corridas recusadas e canceladas, o que vem sendo alvo de reclamação de consumidores. Com combustíveis caros e as taxas cobradas pelos aplicativos, os trajetos mais curtos não compensam na maioria dos casos, segundo eles.
“Algumas cidades têm uma demanda alta de corrida, e outras uma demanda muito baixa. Para um motorista fazer um faturamento bruto de R$ 150 a R$ 200 por dia, ele acaba trabalhando de 10 a 12 horas por dia. Sendo que, desse valor, 50% são lucro e outros 50% são despesa”, diz o motorista Alvim E.S., que preferiu não ter o nome completo divulgado.
A fuga de motoristas de apps se repete em outras capitais do país. O motorista Carlos Araujo, do Recife, diz que o trabalho e o risco de transportar passageiros pelos aplicativos valem a pena para dois tipos de motorista: o que possui carro próprio e o que tem condições de investir no combustível GNV, mais barato. “Para os outros, a situação se complica”, afirma.
“Com a gasolina, está meio a meio: se você ganha R$ 100, você gasta R$ 50 de combustível, que não é o suficiente. Tem o desgaste do carro, a depreciação do veículo ao longo do tempo. O lucro pouco compensa. Infelizmente, o desemprego e a falta de opção obrigam a isso”, diz.
Motoristas que conseguem trabalhar com GNV, no entanto, afirmam que também têm prejuízos. “O valor do GNV era R$ 2,79 o metro cúbico, hoje está em R$ 4,19 o metro cúbico. Tem lugar em que está R$ 4,30 o metro cúbico”, conta Rodrigo de Leyoón Herneck, que, mesmo desempregado e sem outra fonte de renda, desistiu de trabalhar com o carro alugado na cidade do Rio de Janeiro.L
Para a professora de economia do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) Juliana Inhasz, o caminho para o preço dos combustíveis cair passa pelo controle das turbulências políticas, o que poderia gerar mais confiança em investidores internacionais e a volta do crescimento econômico do país. “Uma parte significante desse aumento de preço vem da taxa de câmbio”, afirma.
“Nos últimos tempos, a gente já tem feito essas políticas de aumentar juros de uma forma razoavelmente agressiva, e a gente não está conseguindo ver a taxa de câmbio cair, porque aí entra o segundo fator: o político. O Brasil é um país considerado muito vulnerável”, comenta.
A 99 afirmou que seu reajuste busca “manutenção do equilíbrio da plataforma junto ao objetivo de continuar oferecendo uma fonte de ganho aos motoristas parceiros em um meio de transporte financeiramente viável, seguro e eficiente para a população”.
A Uber disse que sempre busca considerar as necessidades dos motoristas parceiros e que tem feito uma revisão e reajustado os ganhos dos motoristas parceiros em diversas cidades.
Com informações do R7